domingo, 19 de julho de 2009

ESPECIAL - TRANSPÚBLICO: Discussões sobre Transportes vão desde Copa do Mundo até a Sensibilidade da Indústria pelo senso estético do passageiro

• Feira e Ciclo de Palestras em São Paulo discute transportes em toda América Latina.

• Necessidade de investimentos em soluções rápidas para preparar o Brasil para a Copa do Mundo e a diversidade de carências do País foram a tônica principal da Transpúblico


A FIFA já fez o alerta: os investimentos no setor de transportes no Brasil, principalmente nas 12 cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 estão a passos muito lentos. Em contra-partida, o Ministro das Cidades, Márcio Fortes, salientou que já estão previstos recursos de proximadamente 4 bilhões de reais para o setor de transporte público nas cidades que receberão as delegações mundiais, dentro do chamado PAC - Programa de Aceleração do Crescimento – da Copa do Mundo. Apesar de a cifra parecer ser alta e 2014 parecer distante, a verdade é que esses recursos e prazo são apertadíssimos quando se trata em investimentos em transporte. Algumas cidades já não dão conta de maneira digna nem de seus passageiros habituais, quanto mais de turistas, que aumentarão a demanda por transportes públicos e obviamente vão exigir um serviço de qualidade.

A imagem do Brasil no Mundo, que será projetada pelo Mundial, depende para uma boa fama de soluções nas áreas de segurança pública e transporte. Essa foi a tônica principal dos debates da Terceira Edição da Transpúblico e do 22º Seminário da NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), entre os dias 14 e 16 de julho, no Transamérica Expo, zona Sul da Capital Paulista. O blog esteve lá e acompanhou propostas e debates não só de empresários de ônibus e fabricantes, mas de especialistas no setor.

ÔNIBUS URBANO DE 15 METROS, INDICADO PARA CORREDORES SEGREGADOS, APONTADOS COMO SOLUÇÃO RÁPIDA PARA ATENDER A DEMANDA NA COPA DO MUNDO

BRT – Solução Rápida e Menos Cara
Entre especialistas, empresários e administradores públicos, o consenso foi de que o transporte ferroviário, com malha maior de Metrô de “dignificação” da malha de trens já existente, seria a solução mais próxima do ideal, porém, a mais cara e difícil de ser aplicada, principalmente em pouco menos de 5 anos.

Com base nos investimentos que foram realizados na Copa do Mundo da Alemanha, realizada em 2006, e em outras cidades que não abrigaram Mundiais ou jogos esportivos, mas que precisaram de soluções rápidas, o exemplo vem do BRT (Bus Rapid Transit), o ônibus de trânsito rápido, que consiste em oferecer em corredores segregados das outras vias de rolamento, um sistema de ônibus de média e alta capacidades, com rapidez e conforto.

De acordo com Marcos Bicalho, em palestra, diretor-superintendente da ANTP, cada quilômetro de um BRT, um corredor exclusivo, custa aproximadamente US$ 10 milhões de contra US$ 50 bilhões de um sistema VLT (Veículo Leve Sobre Trilhos) e contra US$ 90 milhões de metrô.

E Bicalho garante que se as linhas forem bem projetadas e os ônibus usados nestes corredores forem do modelo ideal, os benefícios serão os mesmos que os oferecidos pelo sistema de trilhos, com a vantagem de o custo de operação e instalação ser menor, além de necessitar mexer menos com a paisagem urbana, havendo menos escavações, obras de risco e desapropriações.

ÔNIBUS COM PISO BAIXO TOTAL, SEM DEGRAUS NO MEIO DO CORREDOR. INDICADO PARA PISTAS SEGREGADAS E COM FÁCUIL ACESSO PARA PASSAGEIRO

DEMOS O EXEMPLO QUE NÃO SEGUIMOS
E por incrível que possa parecer, um dos países que apresentou o BRT nos padrões modernos para todo o mundo foi o Brasil. “No entanto, elaboramos a lição de casa, mas não fizemos completamente.” A opinião é do ex-governador do Paraná, Jaime Lener, que esteve no ciclo de palestras e na feira. Nos anos 70, chamado de audacioso por deixar a opção de Metrô de lado, Lerner implantou em Curitiba um dos primeiros sistemas BRT da América Latina, com os ônibus em vias segregadas e estações-tubo.

A idéia foi de criar linhas que ligassem os extremos da cidade em corredores, dando prioridade ao transporte público. Estas linhas contam com veículos de média e grande capacidade, como ônibus alongados, articulados ou bi-articulados. O sistema foi considerado um sucesso. Foi seguido pela Colômbia, Chile, México, China, Reino Unido e Estados Unidos. Engenheiros públicos e de empresas visitavam Curitiba para estudar a tecnologia desenvolvida no Brasil. Mas o Brasil esmo pouco a seguiu.

ÔNIBUS PARA SISTEMA DE TRÂNSITO RÁPIDO EM CORREDOR. TECNOLOGIA BRASILEIRA RODANDO NO CHILE. “Criamos o exemplo mas não seguimos”

Há alguns trechos na Capital Paulista, poucos com a concepção de via segregada e pontos de ultrapassagem, no Corredor ABD (São Mateus – São Paulo a Jabaquara – São Paulo, servindo as cidades de Diadema, Mauá, São Bernardo do Campo e Santo André), e outros projetos em alguns municípios brasileiros.

Aliás, a base do Corredor ABD foi apontada no evento como uma das alternativas diretas para a Copa. O serviço já vai até a região da Berrini, na zona Sul de São Paulo. O prolongamento do serviço segregado até a região do Estádio do Morumbi, que deve abrigar os principais jogos da Copa, seria um reforço interessante para o sistema ferroviário da região.

Lerner, no entanto, lembrou que mesmo o BRT sendo uma iniciativa mais rápida, a hora para implementá-lo em alguns casos e expandi-lo, é agora.

No evento foi discutido também o fato de muitos estádios não terem estacionamentos suficientes para a demanda de quem utilizará o automóvel. E mais uma vez, até para quem usa o carro, os transportes coletivos podem ser a solução. Isso porque, a exemplo do que aconteceu na Alemanha na Copa e na China, nos últimos jogos olímpicos em 2008, as administrações públicas, em parceria com a iniciativa privada, criaram bolsões de estacionamento a alguns quilômetros dos centros esportivos. De lá, os motoristas eram levados de ônibus de média e alta capacidade para os estádios. A medida é para evitar aglomerações e vias sem a possibilidade de circulação devido aos congestionamentos nas imediações dos estádios.

BRASIL: UM PAÍS CONTINENTAL, DE DIVERSIDADES, QUE EXIGE UM TRANSPORTE QUE ATENDA ESTAS DIVERSIDADES

A Copa do Mundo não foi o único assunto discutido na Transpúblico, evento promovido pela NTU, Abrati (Associações que representam empresas de ônibus) e Fabus (que reúne as encarroçadoras).

Com a participação de mais de 70 empresas, entre montadoras, encarroçadoras, empresas de auto-peças e acessórios, montadoras, revendedoras e viações, foi demonstrada uma visão que já vinha nascendo aos poucos nos operadores e administradores de transportes: apesar de ser necessário uma política nacional para o setor, o Brasil é um país de grande diversidade econômica, cultural e territorial, e os transportes também devem ser pensados localmente, para atender a cada demanda.

Se, antigamente, um modelo de ônibus tinha de servir para o País todo, hoje os fabricantes são unânimes de que deve haver um atendimento específico para cada região e passageiro. E a gama de modelos apresentados na feira mostrou isso. Para cidades que necessitem de corredores exclusivos e possuem grande número de passageiros, foram apresentados veículos e chassis articulados, bi-articulados e trucados (três eixos) urbanos.

E cada cidade tem uma legislação e uma necessidade diferente, principalmente para portadores de deficiência física. Por isso, além do tamanho destes chassis, as formas de apresentação são agora mais variadas (piso baixo para os corredores), elevadores para pisos que não permitem ônibus com assoalhos próximos ao solo e o sistema Low Entry, intermediário para os dois casos, no qual, ao parar no ponto, por sistema pneumático, o ônibus “se abaixa” para o embarque do passageiro.

Uma opção interessante para ônibus com acessibilidade para portadores de deficiência ou locomoção limita, apresentada este ano pela Volvo é o chassi B9 SALF. Com carroceria Caio Mondego LA, o ônibus inteiro é de piso baixo, evitando os degraus internos, em carrocerias cuja frente e meio têm piso baixo, mas da metade para trás, o piso é convencional, havendo a necessidade de degraus no meio do corredor do ônibus.

ÔNIBUS MIDI, OS MICRÕES, CUSTO MENOR, DISPENSA DO SALÁRIO DO COBRADOR E VERSATILIDADE ATRAEM EMPRESÁRIOS

PREFERÊNCIA DO EMPRESARIADO
Apesar de os ônibus de média e alta capacidade serem apontados como soluções para as grandes cidades, o evento foi nacional e contemplou empresas de várias regiões do Brasil, que possuem condições de asfalto precárias, ruas e avenidas estreitas e linhas em bairros com muitos desníveis curvas. Por isso, os chassis e carrocerias midi, os chamados micrões, intermediários entre micro-ônibus e ônibus convencionais eram os mais procurados quando os representantes dos fabricantes perguntavam aos empresários: “Qual seu modelo de interesse?” Além das razões acima, os custos de manutenção destes veículos são menores e, uma triste realidade social, dispensam cobradores, mão de obra a menos para pagar
salário.

Alguns micrões, como Sênior Midi, Spectrum, Foz Super, oferecem capacidade de passageiro igual a alguns ônibus antigos, como Vitória, Amélia e Gabriela, mas sem o cobrador e com consumo e manutenção menores.

Em algumas cidades, empresas inteiras já operam com micrões. Solução que ainda é alvo de contestações, já que o motorista tem de dirigir e cobrar ao mesmo tempo, num veículo cujas dimensões são um pouco inferiores aos convencionais. Mas o mercado de chassi e carrocerias não perdeu tempo e a gama destes veículos é bastante grande.

TRANSPORTE ESCOLAR
Outro grande desafio para o setor de transportes no País é a locomoção de estudantes, principalmente em áreas rurais ou com pavimento precário. Enquanto escolas particulares nos grandes centros urbanos já oferecem veículos com todas as condições de segurança, em algumas cidades do interior do Brasil, a vida de estudantes é colocada em risco. Quando há ônibus, a maioria é sem nenhuma adaptação para transporte de crianças do primeiro grau, os veículos são velhos, com idade entre 20 e 30 anos, que um dia já foram operados em cidades grandes. Os veículos não possuem manutenção e nem preparo para enfrentar lama e barro. O estudante também é obrigado a dividir espaço com trabalhadores rurais e pessoas que precisam ir ao médico e não contam com transporte específico.

Onde há incentivo público, no entanto, a situação começa a mudar. E a indústria oferece opções.

ÔNIBUS “FORA DE ESTRADA” PREPARADO PARA TRANSPORTE DE ESTUDANTES EM LOCAIS DE DIFÍCIL ACESSO

Chamaram a atenção na Transpúblico dois modelos de ônibus “off road”, para fora de estrada. O micro Mascarello Gran Mini e o midi Caio Foz Super. Eles possuem visual de fora de estrada, quebra mato e o principal, a suspensão é bem elevada, deixando o piso a uma distância do solo, suficiente para o veículo enfrentar lama, buraco e desnível, levando estudante e funcionário de escola com segurança. Para as crianças menores o Foz Super oferece banco cm capacidade para três crianças cada.com cinto de segurança. O espaço para cadeira de rodas.

A REAÇÃO DO TRANSPORTE TERRESTRE DE PASSAGEIROS

LEGENDA: VEÍCULOS QUE SÃO VERDADEIROS AVIÕES TEREESTRES. RESPOSTA DOS FABRICANTES E DAS EMPRESAS AO CRESCIMENTO DO NÚMERO DE PASSAGEIROS DE AVIÕES

Outro ponto que ficou evidente na exposição e que demonstra uma preocupação dos empresários do setor de transporte terrestre de passageiros é a reação ao crescimento do mercado aéreo barato.

A passagem do avião para alguns lugares quase é do mesmo valor da passagem de ônibus, o que faz o usuário optar pela forma mais barata de viagem. Além de oferecer preços competitivos, a opção para o empresário do setor terrestre é oferecer qualidade no serviço. A indústria de ônibus percebeu isso e viu que as soluções estão em pequenos detalhes. Assim, na feira, foi possível encontrar verdadeiros “aviões terrestres”. Ônibus de luxo que oferecem mimos para o passageiro e até um conforto bem maior que um avião de classe econômica. Veículos com bancos que viram cama, com climatizadores de ar, equipamentos de som e imagem de última geração, na era do LCD e Full HD, entre outros “luxos” que há 20 anos eram impensáveis nos ônibus.

ÔNIBUS, BOM GOSTO E ESTÉTICA

LEGENDA: PASSAGEIRO REPARA SIM NO DESIGN DO ÔNIBUS. A INDÚSTRIA DO SETOR NA ÚLTIMA DÉCADA DEU ATENÇÃO ESPECIAL ÀS LINHAS DO VEÍCULO E PINTURAS QUE MOSTRAM SEGURANÇA E BELEZA, COMO AS PINTURAS REFLETIVAS NOTURNAS

Além dos equipamentos de luxo, de acordo com os palestrantes, uma arma para o setor de transportes é a estética. A indústria pensava menos nisso há uma década, mas o passageiro se importa sim com ônibus bonitos. Veículos de linhas modernas e pinturas que reluzem até a noite foram o grande atrativo do público. Destaque para os modelos Irizar PB, da Geração Sete da Marcopolo e do Panorâmico DD da Busscar.

A feira mostrou que o público em geral se interessa por transporte, mesmo que inconscientemente e que o setor agora começa a entrar nos trilhos (apesar de ser ônibus), e a pensar que o País tem uma necessidade geral, mas demandas específicas e localizadas e que o passageiro, ou mesmo o motorista do carro ao lado, tem senso estético e que o ônibus devem em suas linhas oferecer conforto, o que é mais que obrigação, mas também harmonia e beleza. Afinal, o ônibus faz parte da paisagem das cidades e estradas.

Cobertura, textos e fotos: Adamo Bazani
Vejam no Portal InterBuss mais fotos da Transpúblico

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